O velho do Restelo (ou será de Belém?)
Só hoje reparei que as secratária de estado dos Transportes, Ana Paula Vitorino, chamou "velhos do Restelo" ao PSD por criticarem os investimentos públicos, sobretudo o TGV.
Independentemente da razão ou falta dela por parte de Ana Paula Vitorino, o que me chama a atenção é mais uma vez a utilização da figura do "Velho do Restelo" tipificando aqueles que estão contra o progresso e favorecem o imobilismo. Eu sei que esta leitura do episódio do "Velho do Restelo" é recorrente (reflectida, por exemplo, também, Wikipédia), mas nem por isso deixa de ser errada.
Errada porquê? Quem ler com olhos de ler todo o episódio verá que o Velho do Restelo está longe de ser uma personagem que Camões trata com desprezo. Bem pelo contrário, conforme eu já escrevi, no meu outro blog, Humanae Litterae (que, diga-se a bem da verdade, anda um bocadinho abandonado, mas o tempo não me permite, para já, ser mais assíduo), num artigo chamado "Em defesa do Velho do Restelo".
Mas, para quem não tiver paciência para ler o artigo (é um bocadinho longo), sempre pode recorrer à entrada Velho do Restelo da História da Literatura Portuguesa (Universal), que termina assim:
O Velho do Restelo representa o conhecimento experiente do mundo e da alma, de forma dramática e profundamente humana. Incarna uma corrente de ideias que, no fundo, está consciente dos aspectos negativos do feito épico que Camões conta. De notar que, em Os Lusíadas, ele representa a lucidez e não tem o sentido retrógrado e agoireiro com que corre, como expressão popular.
Se calhar, era tempo das nossas elites actualizarem os seus lugares-comuns, as suas metáforas, pois, por vezes, algumas, tal como o "Velho do Restelo" baseiam-se em interpretações que não resistem a uma análise dos textos que lhe deram origem.
Aliás, como se refere no Insurgente, o inquilino de Belém parece que está a ficar um bocadinho descontente.