Letras deprimidas
A ler esta entrada Abandonar Tebas de Daniela Kato sobre as Faculdades de Letras destaco esta passagem, porque, infelizmente, derivado da minha própria experiência, penso que ela é dolorosamente verdadeira:
Desenganem-se os que pensam que as Faculdades de Letras são hoje (se é que alguma vez foram) lugares de cultura, se por «cultura» entendermos todo um conjunto de valores, linguagens, práticas e atitudes perante o conhecimento, transmitidos de geração em geração. É um daqueles mitos que os anos mais recentes de decadência deitaram, em definitivo, por terra. Num espaço em que se devia cultivar – e cultivar remete-nos para uma ideia de cuidado, de zelo – a criatividade, o gosto pela leitura e a sensibilidade crítica, promove-se antes a erudição inerte, balofa, fechada sobre si própria. [...] Em vez de encontrar, como esperava ingenuamente no início, o estímulo para trilhar de forma independente caminhos novos, cedo percebi que essas pessoas esperam sobretudo a confirmação e a repetição ad nauseam das suas certezas reconfortantes.
Por outro lado, e falo do exemplo que conheço melhor, a FLUP, o ambiente da última vez que lá fui, em Março de 2007, era absolutamente deprimente. Uma faculdade com muito pouca vida. Algo que a Daniela também refere:
Apesar da distância, não consigo deixar de pensar nas desgraças em que está mergulhada a minha velha faculdade e, em especial, os seus desertificados departamentos de Línguas e Literaturas, sem futuro à vista. «A culpa é do capitalismo selvagem», diz-me um dia um catedrático, com ar de vítima. «A culpa é da sociedade, que deixou de nos compreender», comenta um outro, na altura com responsabilidades de direcção departamental. Tudo reflexões dotadas de grande profundidade e honestidade intelectual. E não tenho dúvidas de que as ditas criaturas por lá ficarão, inertes dentro das suas tocas, à espera que o capitalismo acabe e a sociedade mude, por decreto ou, quiçá, por milagre.
Ainda por cima as faculdades de letras ficaram estupidamente presas à formação de professores. Tendo este caminho chegado ao seu fim, pois a demografia assim o decretou, parecem não saber que rumo devem tomar, o que devem ensinar. A Daniela falou do imobilismo de quem tem responsabilidades. Mas este imobilismo alarga-se também aos estudantes que lá são formados.
Em Dezembro de 2006, estive envolvido num colóquio realizado na FLUP, Portas fechadas, janelas abertas, onde se tentou reflectir sobre as saídas profissionais para os licenciados de línguas românicas. O que me impressionou nas dezenas de licenciados que lá estavam e que, por uma ou outra razão, não tinham obtido a saída profissional que ambicionavam, foi exactamente o seu imobilismo, a não procura de soluções alternativas, o finca-pé em só quererem trabalhar naquilo que esperavam trabalhar, esperando sempre que o governo lhes resolva o assunto. Nem todos tinham esta atitude, mas havia um número significativo que a tinham.
Ora, isto é, na minha opinião, também uma consequência daquilo que a Daniela diz na sua entrada: as Faculdades de Letras não ensinam a pensar pela sua própria cabeça. Mais do que uma agência de empregos (as faculdades, sejam elas quais forem, não têm que formar licenciados para este ou aquele emprego), as faculdades têm que ensinar os seus alunos a pensarem, para que estes usem a capacidade de pensar e pesquisar que, em princípio adquiriram na passagem pelo ensino superior, nas suas actividades profissionais.
Certo é que a situação está longe de ser animadora nas Humanidades.
Desenganem-se os que pensam que as Faculdades de Letras são hoje (se é que alguma vez foram) lugares de cultura, se por «cultura» entendermos todo um conjunto de valores, linguagens, práticas e atitudes perante o conhecimento, transmitidos de geração em geração. É um daqueles mitos que os anos mais recentes de decadência deitaram, em definitivo, por terra. Num espaço em que se devia cultivar – e cultivar remete-nos para uma ideia de cuidado, de zelo – a criatividade, o gosto pela leitura e a sensibilidade crítica, promove-se antes a erudição inerte, balofa, fechada sobre si própria. [...] Em vez de encontrar, como esperava ingenuamente no início, o estímulo para trilhar de forma independente caminhos novos, cedo percebi que essas pessoas esperam sobretudo a confirmação e a repetição ad nauseam das suas certezas reconfortantes.
Por outro lado, e falo do exemplo que conheço melhor, a FLUP, o ambiente da última vez que lá fui, em Março de 2007, era absolutamente deprimente. Uma faculdade com muito pouca vida. Algo que a Daniela também refere:
Apesar da distância, não consigo deixar de pensar nas desgraças em que está mergulhada a minha velha faculdade e, em especial, os seus desertificados departamentos de Línguas e Literaturas, sem futuro à vista. «A culpa é do capitalismo selvagem», diz-me um dia um catedrático, com ar de vítima. «A culpa é da sociedade, que deixou de nos compreender», comenta um outro, na altura com responsabilidades de direcção departamental. Tudo reflexões dotadas de grande profundidade e honestidade intelectual. E não tenho dúvidas de que as ditas criaturas por lá ficarão, inertes dentro das suas tocas, à espera que o capitalismo acabe e a sociedade mude, por decreto ou, quiçá, por milagre.
Ainda por cima as faculdades de letras ficaram estupidamente presas à formação de professores. Tendo este caminho chegado ao seu fim, pois a demografia assim o decretou, parecem não saber que rumo devem tomar, o que devem ensinar. A Daniela falou do imobilismo de quem tem responsabilidades. Mas este imobilismo alarga-se também aos estudantes que lá são formados.
Em Dezembro de 2006, estive envolvido num colóquio realizado na FLUP, Portas fechadas, janelas abertas, onde se tentou reflectir sobre as saídas profissionais para os licenciados de línguas românicas. O que me impressionou nas dezenas de licenciados que lá estavam e que, por uma ou outra razão, não tinham obtido a saída profissional que ambicionavam, foi exactamente o seu imobilismo, a não procura de soluções alternativas, o finca-pé em só quererem trabalhar naquilo que esperavam trabalhar, esperando sempre que o governo lhes resolva o assunto. Nem todos tinham esta atitude, mas havia um número significativo que a tinham.
Ora, isto é, na minha opinião, também uma consequência daquilo que a Daniela diz na sua entrada: as Faculdades de Letras não ensinam a pensar pela sua própria cabeça. Mais do que uma agência de empregos (as faculdades, sejam elas quais forem, não têm que formar licenciados para este ou aquele emprego), as faculdades têm que ensinar os seus alunos a pensarem, para que estes usem a capacidade de pensar e pesquisar que, em princípio adquiriram na passagem pelo ensino superior, nas suas actividades profissionais.
Certo é que a situação está longe de ser animadora nas Humanidades.