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Super Flumina

Liberae sunt enim nostrae cogitationes - Cícero (Mil. 29 - 79) . Um blog de Rui Oliveira superflumina@sapo.pt

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Liberae sunt enim nostrae cogitationes - Cícero (Mil. 29 - 79) . Um blog de Rui Oliveira superflumina@sapo.pt

Quinto Horácio Flaco

Horácio, nasceu em 8 de Dezembro de 65 a.C. e faleceu (se a data está certa pois já vi uma diferente) em 27 de Novembro de 8 a.C. Foi um poeta extremamente importante não só na sua época, mas também na história da literatura ocidental, sobretudo do séc. XV ao séc. XVIII. Quer através da sua Epistola ad Pisones (mais conhecida por Arte Poética), que através das suas Odes, Horácio influencia desde Camões a Correia Garção. Para lembrar um dos grandes poetas de sempre, deixo um dos seus poemas mais famosos (e divulgado, por exemplo, no "Clube dos Poetas mortos") e a tradução para português de David Mourão-Ferreira.

Tu ne quaesieris, scire nefas, quem mihi, quem tibi
finem di dederint, Leuconoe, nec Babylonios
temptaris numeros. ut melius, quidquid erit, pati.
seu pluris hiemes seu tribuit Iuppiter ultimam,
quae nunc oppositis debilitat pumicibus mare
Tyrrhenum: sapias, uina liques, et spatio breui
spem longam reseces. dum loquimur, fugerit inuida
aetas: carpe diem quam minimum credula postero.

Horácio, Odes, I, 11


Não procures, Leuconoe, - ímpio será sabê-lo -
que fim a nós os dois os deuses destinaram;
não consultes sequer os números babilónicos:
Melhor é aceitar! E venha o que vier!
Quer Júpiter te dê ainda muitos Invernos,
quer seja o derradeiro este que ora desfaz
nos rochedos hostis ondas do mar Tirreno,
vive com sensatez destilando o teu vinho
e, como a vida é breve, encurta a longa esp'rança.
De inveja o tempo voa enquanto nós falamos:
trata pois de colher o dia, o dia de hoje,
que nunca o de amanhã merece confiança.

Trad. de David Mourão-Ferreira

Multiculturalismos...

Que o multiculturalismo e o politicamente correcto têm efeitos perversos é bem sabido. Entre os estes efeitos, está o totalitarismo, pois querem impor a todos, em todos os aspectos da vida, um "pensamento único" que não pode ser nunca posto em causa.

Reza a cartilha multiculturalista e politicamente correcta que se respeitar todas as culturas e que em caso algum se pode ofendê-las (é claro que para esta gente há uma notável execepção: a civilização ocidental, o cristianismo e o homem branco podem ser denegridos à vontade).

Esta cartilha multiculturalista é perfeitamente castradora como se pode ver, na Inglaterra, com o caso de uma peça de Christopher Marlowe, dramaturgo inglês do período isabelino, que viu uma das suas peças, Tamburlaine the Great, modificada de modo a não ofender sensibilidades muçulmanas, tal como é relatado no Times Online:
T WAS the surprise hit of the autumn season, selling out for its entire run and inspiring rave reviews. But now the producers of Tamburlaine the Great have come under fire for censoring Christopher Marlowe’s 1580s masterpiece to avoid upsetting Muslims.

Audiences at the Barbican in London did not see the Koran being burnt, as Marlowe intended, because David Farr, who directed and adapted the classic play, feared that it would inflame passions in the light of the London bombings.

Simon Reade, artistic director of the Bristol Old Vic, said that if they had not altered the original it “would have unnecessarily raised the hackles of a significant proportion of one of the world’s great religions”.
Notem a cobardia da frase que coloquei em destaque. Normalmente os artistas, e muito bem, não têm estes pruridos quando se trata de criticar o cristianismo. Porque será? É que o cristianismo, juntando todas as igrejas e seitas cristãs têm mais fiéis do que o islamismo em todo o mundo. No entanto, isso não impede os artistas de o criticarem. Ou será que este director teve medo de sofrer o mesmo destino do Theo van Gogh? Se foi o caso, então as sociedades ocidentais estão a deixar-se sequestrar por uma minoria de islamistas radicais. E isso é preocupante. Mas eu não acredito que tenha sido só isso. Antes de avançar, só mais um exemplo:
Members of the audience also reported that key references to Muhammad had been dropped, particularly in the passage where Tamburlaine says that he is “not worthy to be worshipped”. In the original Marlowe writes that Muhammad “remains in hell”.
Será lícito alterar obras antigas para que estas se conformem com os cânones em vigor. É claro que não. Deixem-me dar um exemplo mais português. Os alunos do 9.º ano estudam o Auto da Barca do Inferno de Gil Vicente e isto há já vários anos - aliás o Gil Vicente já fazia parte do programa do 9.º ano quando eu por lá passei (e eu andei no primeiro 9.º ano de que há memória, como aliás já tinha acontecido com o 7.º, 8º, 10.º etc...)- e neste auto aparece uma personagem referenciada, apenas e só como JUDEU.

Ora esta personagem é apresentada de modo altamente desfavorável, nem sequer faz o percurso da maioria das outras personagem (barca do inferno - barca do paraíso - barca do inferno). Isto é, o JUDEU nem sequer é digno de tentar a entrada no Paraíso. E ainda por cima nem o diabo o quer na sua barca e manda-o para um barco que vai a reboque. Digamos que é uma cena de anti-semitismo "avant la lettre" (é preciso notar que o anti-semitismo enquanto conceito nasceu apenas no séc. XIX; mas a perseguição aos judeus é bem antiga).

Deveríamos eliminar ou reformular esta passagem? É lógico que não. Há muitas maneira de falar nisto numa sala de aulas, por exemplo. Uma obra é fruto de uma época, de um contexto, de uma sociedade. Tentar adaptá-las aos tempos modernos em nome de evitar a ofensa a um determinado grupo é absolutamente ridículo.

De qualquer modo o que se nota aqui é uma situação de "dois pesos e duas medidas". Normalmente quando se trata do cristianismo, seja a "Última tentação de Cristo", seja o "Je vous salue Marie", ou a "Jerry Spring Opera" os artistas não têm esta vontade de não ofender uma das maiores religiões do mundo.

Por minha parte, acho que os artistas têm liberdade para dizer o que quiserem. Eu reservo-mo no direito de gostar ou não ou, então, nems equer ir ver porque, pura e simplesmente isso não me interessa. Nunca me verão é em manifestações para impedir uma peça ou a exibição de um filme.

A Net, a ONU e os Estados Unidos...

Daqui a alguns dias, vai realizar-se na Tunísia uma cimeira mundial sob égide ONU em que estará em questão o futuro da Internet.

Kofi Annan, a 5 de Novembro, ainda tentou traquilizar os que duvidam das boas intenções da ONU, escrevendo um artigo no Washington Post que The U.N. Isn't a Threat to the Net (que penso ser o mesmo que saiu no Público). Claro que, perante palavras tão sábias, ficamos todos mais sossegados, a conferência até vai ser realizada num país que defendem os direitos humanos. Não é assim?

É óbvio que há pessoas que acham um desaforo o "controlo" da Internet estar nos Estados Unidos (ver aqui e aqui), mas de facto, se a Internet caísse sob a alçada da ONU, bem poderíamos dizer adeus a liberdade de expressão na mesma.

Aliás, uma organização que duvida da bondade dos objectivos da ONU é a muito insuspeita RSF, ou seja, os Repórteres sem Fronteiras. Na sua página oficial, esta organização toma a sua posição nesta questão com o texto Gouvernance d’Internet : la position de Reporters sans frontières. Sobre o controlo exercício pelo ICANN sobre os nomes dos domínios a nível mundial, dizem os RSF (destaques meus):
Cette situation est certes critiquable, mais les solutions proposées pour y remédier semblent bien pires. La Chine, Cuba et les pays les plus répressifs de la planète cherchent à attribuer la régulation du Réseau à une organisation supranationale indépendante, entendez l’ONU. Or, lorsque l’on connaît l’incurie de cette organisation en matière de droits de l’homme - rappelons que sa commission ad hoc a récemment été présidée par la Libye -, l’idée fait froid dans le dos. Souhaite-t-on vraiment que les pays qui censurent le Net et emprisonnent les internautes se mettent à réguler la circulation de l’information sur le Réseau ? Le simple fait d’organiser ce sommet en Tunisie, un Etat où le Président et sa famille contrôlent la presse et Internet d’une main de fer, démontre que la liberté d’expression n’est pas considérée comme un thème central du SMSI. Pourtant, dans toutes les dictatures de la planète, c’est aussi sur le Web que se diffusent désormais les informations indépendantes, celles qui échappent à la censure. Considérer le Réseau du seul point de vue technique, et ainsi décider que l’Iran et le Viêt-nam devraient participer à sa gestion au niveau mondial, est une erreur qui pourrait coûter cher à des centaines de millions d’internautes.
Aliás, o governo tunisino já apresentou credenciais no passado (ver aqui) de como reprimir o conteúdo dos sítios internet que lhe não agradam. Voltando à tomada de posição dos RSF, elatermina assim:
Il est certes difficilement justifiable que l’ICANN reste ad vitam aeternam sous la coupe d’un seul pays. C’est un point sur lequel les Etats-Unis vont devoir négocier, d’autant qu’ils recommandent eux-mêmes qu’Internet soit géré par le secteur privé. Reconnaissons toutefois que les Américains sont parvenus à développer le Net sans bug majeur ; et admettons également qu’ils sont dans l’ensemble respectueux de la liberté d’expression. Espérons donc qu’un compromis acceptable, c’est-à-dire une solution qui réduit au minimum l’intervention des Etats et garantit la liberté d’expression, sera trouvé lors du SMSI. Si tel n’est pas le cas, mieux vaut ne rien changer.
De facto, a intervenção da ONU na regulação da Internet apenas iria fazer com que acabasse a liberdade de expressão neste meio.

Presidenciais Watch

Faz-me rir quando Jerónimo de Sousa diz que a vitória de Cavaco poderia mutilar a democracia.

Quando o mesmo Jerónimo pretende, na sua campanha, avivar "a memória dos portuguesas em relação aos dez anos que o antigo primeiro-ministro governou o país", também, já que Jerónimo pensa que a democracia pode estar em perigo, podemos fazer esse exercício de memória em relação ao passado antidemocrático (e, obviamente, do seu presente antidemocrático, visto que continuam a declara-se comunistas e "comunismo democrático" é um oxímoro).

Vai agora fazer trinta anos (a 25 de Novembro) que o projecto antidemocrático para Portugal do PCP e da extrema-esquerda foi claramente derrotado. Para quem não viveu esses tempos, basta dizer que Álvaro Cunhal afirmou de que nunca haveria uma democracia parlamentar em Portugal e que se assistiu, sobretudo nesse ano de 1975, a um assalto continuado dos comunistas e outros extremistas de esquerda ao poder para tornar Portugal numa ditadura proletária.

Os comunistas podem ter combatido o regime autoritário salazarista e caetanista, mas queriam implantar uma ditadura ainda pior. Para Cunhal, de leste vinha "o sol da Rússia" que era a sua inspiração. Nunca o PCP condenou o estalinismo e os seus milhões de mortos.

Por tudo isto o PCP e Jerónimo de Sousa, em especial, por ser o seu secretário-geral, não têm quaisquer credenciais qualificadas para falarem de democracia, pois, no seu íntimo, apenas a suportam, mas nunca a ela aderiram sinceramente.

A Intifada francesa

A propósito dos acontecimentos recentes em França, não é demais salientar o que Pacheco Pereira escreveu sobre a violência e as democracias:
Se se pensa que está consolidada nas democracias a condenação da violência como instrumento político, pensa-se mal. Desde que os movimentos radicais da extrema-esquerda e extrema-direita, que defendiam a violência "revolucionária", perderam influência e se desintegraram nos anos 80, com o fim do surto terrorista que das Brigadas Vermelhas italianas, às FP portuguesas, atravessou toda a Europa, que parecia haver um consenso político de intransigência quanto ao uso da violência nos sistemas democráticos. O caso da ETA e do IRA eram excepções que confirmavam a regra de que em democracia a violência estava de todo excluída.

Mas desenganemo-nos. Bastou surgir uma nova violência, com novos actores e novas causas, ocupando, mesmo que ilusoriamente, o local e a memória dessa violência radical do passado, para se verificar que importantes sectores políticos da nossa sociedade democrática mostram uma enorme complacência com a sua utilização como instrumento político. Nos sectores tradicionalmente da "esquerda", e numa "direita" complexada e temerosa, volta de novo a haver um caldo cultural para que a violência política surja como aceitável, como "justificada".

O mecanismo fundamental de aceitação da violência nos nossos dias é uma espécie de sociologia de pacotilha, mais herdeira do marxismo do que parece, que explica a "revolta dos jovens" (bem-aventurado eufemismo) pelas condições sociais da sua vida. É uma "explicação" que tem muito de voluntarismo político e pouco de ciência, embora, como também acontecia com o marxismo no passado, pretenda fornecer uma inevitabilidade causal. Antes, os proletários deveriam fazer a revolução violenta porque eram explorados e a sua "mais-valia" apropriada pelos capitalistas, agora os jovens revoltam-se porque não têm "esperança no futuro" e são marginalizados. Em ambos os casos há sempre uma explicação social útil, que ilude o adquirido político do pensamento democrático, dissolvendo-o nas mesmas perigosas ideias sobre a "justificação" da violência pela causalidade social.
De facto a violência havida em França não pode ter qualquer tipo de desculpa, não pode ser desculpabilizada, seja qual for os motivos que estejam por detrás dela. Mas, há muito gente que tem um tal ódio à democracia representativa que justifica tudo para por a sociedade em vivem em causa. De hipocrisia está o mundo cheio e não há causa justa que possa justificar a contínua destruição de propriedade pública e privada, de uma forma completamente aleatória e cega, que, em caso algum, poderá levar ao melhoramento das condições de vida dos revoltados (se é isso mesmo o que eles querem, coisa que pode duvidar um pouco).

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